Coluna | Era Sol que me faltava
Dando sequência aos escritos sobre os sete pecados capitais, nesta semana, subimos ao segundo círculo do purgatório de Dante, onde encontramos os invejosos com seus olhos costurados por arames.
Sim, este é o castigo daqueles que, em vida, lançaram os olhares sobre a felicidade, os bens, o sucesso alheio, ou ainda, experimentaram sórdido prazer pela dor do outro. Assim, permanecerão privados da luz até que tenham purgado seu pecado.
Muito além de percebermos os pecados como uma questão da moral cristã, ultrapassar esse tênue limiar das condutas virtuosas, despencando na perversão das ações, poderá implicar no adoecimento do nosso ser.
E, me parece, que isto se aplica sobretudo aos invejosos. Já que a inveja é sempre um pecado envergonhado e nunca, em nenhuma circunstância, conseguimos afirmá-la como algo positivo. O que a difere dos demais pecados que, por vezes, até temos orgulho em afirmar que praticamos.
De forma resumida, a inveja se caracteriza pelo meu entristecimento pela felicidade alheia, pela minha dor pelo sucesso do outro. Ou seja, ela toma os contornos de uma admiração que eu tenho pelos bens e sucessos alheios, mas que se dissimula.
Assim podemos perceber porque é tão doloroso nos sentirmos invejosos, necessariamente eu estou prestando uma homenagem ao meu invejado, que tem o que eu gostaria de ter, que é o que eu gostaria de ser, que se alegra como eu gostaria de me sentir. Então, quando sentimos inveja acabamos recebendo uma oportunidade de nos avaliar e compreender aquilo que nos falta.
O que é cômico é o fato de sermos pouco ou nada capazes de nos assumirmos invejosos, mas, quase que em uma totalidade, nos sentimos invejados. Cabe aqui que nos façamos uma pequena pergunta:
O que tenho de tão maravilhoso, único, especial ou virtuoso que poderia despertar a inveja alheia? Havemos de ser mais cautelosos, afinal, outra nuance da inveja é se oferecer à nós como um encosto para aceitação dos fracassos. E como? Ora, dizemos que o que nos impediu as conquistas não foi talvez, minha falta de dedicação e competência, mas o fato do outro ter me invejado ao ponto de me destruir.
Invejamos quem nos é próximo, nosso sentimento produz um vínculo com aquele para quem o direcionamos. Normalmente é nosso irmão, vizinho, cunhado, colega de trabalho, sempre alguém que está perto e que possui bens e atributos que eu não disponho e eu não sou capaz de permitir que o outro tenha sem sofrer com isso. Denota uma dificuldade de estabelecer os limites do próprio Eu.
É, esta é só mais uma forma de arrogância, olhamos o outro, o observamos e avaliamos sua vida com a régua que mede a nossa existência. Tudo que ele tem ou é, em relação a mim.
O exemplo artístico que escolhi para representar a inveja é uma pintura do assassinato de Abel, por parte do seu irmão Caim (filhos de Adão e Eva nos textos bíblicos), que não foi capaz de superar o fato do irmão ser mais apreciado que ele por Deus.
Caloroso cumprimento e até semana que vem.
Solange Kappes
Psicóloga CRP 12/15087
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