A terapia daqueles que agem é mais fácil em detrimento daqueles que só sonham agir. A busca pela psicoterapia se dá pelas mais diversas razões, mas tem sido cada vez mais frequente por parte daqueles que esperam encontrar coragem para tomar decisões importantes. Para onde ir? Qual caminho escolher? Cursar isto ou aquilo? Trabalhar aqui ou acolá? Namorar ou ficar solteiro? A gama de possibilidades de vidas para se viver tem aumentado muito os níveis de angústia das pessoas.
É justamente a possibilidade uma vida mais livre, que decorra, em boa medida, das escolhas que fazemos, que nos torna mais angustiados e ansiosos. Se a vida nos escravizasse, se as circunstâncias nos determinassem – talvez condicionem – se a natureza nos incutisse uma essência, não haveriam sofrimentos pelo futuro e nossa vida seria o que ela só poderia ser.
A angústia, para alguns, tem sido paralisante. A consciência da quantidade de recusas e perdas de vidas hipotéticas que uma escolha implica, crava os pés de muitos nas circunstâncias da vida atual e, de brinde, cresce um sentimento de lamentação pelo não vivido e escolhido. Este lamento pelo não vivido, não escolhido, não concretizado é dos conteúdos terapêuticos mais complexos de se trabalhar.
Na série Hannibal, em que o protagonista é interpretado pelo ator Mads Mikkelsen, há um episódio em que o psiquiatra está a tratar de uma paciente que é consumida pelo desejo de assassinar o irmão. Irmão que pratica abusos contra ela, que a humilha e que a força a se sujeitar a absurdos em troca de poder usufruir da herança dos pais falecidos. Jogando com a paciente – por favor considerem que se trata de uma série – Hannibal sugere que a terapia dela seria mais fácil se ela tivesse matado o irmão.
Esta cena me provoca inúmeras reflexões e eu as partilho com alguns pacientes que se sentem ante à dilemas. Parece ser muito mais possível lidar com decisões – que podem ou não resultar em erros ou fracassos – do que com o lamento de não ter decidido quando era preciso. É claro, não percam de vista a lei, nem tudo é permitido, mas, não consigo deixar de pensar que aplicamos demasiadas restrições aos nossos desejos, como se quase nada daquilo que queremos ou desejamos fazer, nos fosse autorizado. O maior medo dos que não agem é ser irracional e cometer equívocos. Mas reforço, em outras palavras: “A terapia é mais fácil se decisões forem tomadas e derem errado, do que rodopiar eternamente sobre um ‘E se’”.
Tudo cobra seu preço, o da vida um pouco mais escolhida e livre, é a angústia que nunca cessará.
Solange Kappes
Psicóloga CRP 12/15087
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