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Coluna | Era Sol que me faltava | A autoexposição e a escravidão da aparência nas redes

Quando tudo é explícito, não resta nada à curiosidade e, portanto, torna-se totalmente desinteressante. Na era digital, o anonimato é das sensações, a mais insuportável de se sentir. Não ser percebido e não receber likes, parece mais dolorido do que ser cancelado ou contestado. O resultado disso é uma superexposição do eu, em geral, totalmente desvelado, que faz com que o valor, que antes era intrínseco ao ser humano, passe para a aparência, para a exposição e para a mercadoria que acabamos nos tornando.

Aliás, quando você não paga pelo produto, você é o produto! Assim é discutido no documentário “O dilema das redes”. Quando, mesmo que de forma inconsciente, assumimos o papel de produto, passamos a atribuir valor positivo a autoexposição e, consequentemente, a aparência. Assim, “parecer ser” se torna mais valoroso do que “ser”. Daqui em diante, desenrola uma série de questões prejudiciais ao sujeito; perpassando fortemente pelo universo da autoestima.

Apostar em um desvelamento do eu, para fazer de si um espetáculo nas redes, se torna uma escravidão autoimposta e também uma causa perdida. Afinal, nada mais instável e escapadiço do que a aparência. Todos, sem exceção, vamos perde-la, por mais procedimentos estéticos que decidamos fazer. Inclusive, não há nada que denuncie mais nossa decadência do que a necessidade e o desespero de fugir dela. Se então, não formos capazes de construir nada mais seguro e estável ao longo da vida, no que iremos nos apegar? O que teremos a oferecer além de uma casca? E não é nem algo a oferecer aos outros, mas a nós mesmos, o que faremos de nós?

De forma coadjuvante, aparece o fato de que tendemos a acusar as redes por serem tóxicas, destrutivas e canceladoras. Quando a responsabilidade de usá-las ou descontinuá-las é unicamente nossa. A consciência está em nós, é preciso fazer uso dela para avaliar em que medida estamos nos fazendo objetos-propaganda de nós mesmos. Afinal, autoexposição é uma forma requintada de autoexploração, que te usa, te abusa, te consome, te cansa, sem que você perceba de onde vem e sem te recompensar devidamente por isso, nem financeira nem afetivamente.

Por fim, o desvelamento, ou poderíamos chamar também de desnudamento do eu, acaba com o mistério e é justamente o mistério e o oculto que permitem a atração e a curiosidade. Não é possível viver considerando que a virtualidade e aquilo que ela oferece nos basta, porque não basta! Se te basta, só posso concluir que tua carência é colossal.

Finalizo: “Daquilo que os outros não sabem sobre mim, disso eu vivo” (Peter Handke)

Solange Kappes
Psicóloga CRP 12/15087
E-mail: psicologasolangekappes@gmail.com
Redes sociais:www.facebook.com/solange.kappes | Instagram: @solangekappes


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