A proporção de idosos acima de 80 anos no total de mortes por covid-19 e internações por semana vem diminuindo gradativamente desde fevereiro em Santa Catarina (veja os detalhes nos gráficos interativos a seguir).
Após três meses de vacinação no Estado, completados no último domingo (18), dados preliminares já sugerem os primeiros efeitos positivos da imunização sobre a pandemia, conforme análise da reportagem da NSC — ainda que os números de mortes, internações e casos ativos permaneçam altos.
Como a vacinação só ganhou ritmo no final de março, especialistas confirmam observar redução de internações e óbitos entre idosos, mas afirmam que ainda é cedo para enxergar com clareza nos dados que a imunização gerou proteção extra contra o coronavírus.
Até esta segunda-feira (19), Santa Catarina aplicou 1.276.878 doses de vacina contra o coronavírus, das quais 899.501 correspondem à primeira dose e 377.377, à segunda. São necessárias duas doses e o ideal é esperar mais 30 dias após a segunda aplicação para se considerar uma pessoa imunizada contra o coronavírus. Das pouco mais de 377 mil pessoas que tomaram as duas vacinas, 71% (269.413 pacientes) têm mais de 60 anos.
A reportagem da NSC analisou e cruzou dados públicos de vacinação e de casos de coronavírus, contabilizados até 15 de abril, para identificar se os efeitos da imunização geraram impacto sobre a pandemia no Estado. Alguns indicadores já se mostram promissores. Veja os detalhes a seguir.
Todas as faixas etárias tiveram alta no total de mortes, mas participação de idosos é menor em abril
Em números absolutos, a terceira onda de infecções por coronavírus, ocorrida a partir da metade de fevereiro, abrangeu pacientes de todas as faixas etárias. Com isso, houve aumento em números absolutos de infectados, mortes e internações tanto em crianças e adolescentes, quanto em jovens e idosos.
No entanto, ao observar a proporção de cada faixa etária no total de novas mortes ou novas internações por semana, os dados sugerem que gradativamente há menos idosos entre esses pacientes, especialmente a partir dos 80 anos.
Mortes por faixa etária
A participação de pessoas acima de 60 anos no total de mortes ocorridas semanalmente em Santa Catarina vem reduzindo. Eles representavam 81,36% das mortes ocorridas na semana entre 17 de janeiro e 23 de janeiro, quando começou a vacinação no Estado, e caiu para 62,84% na semana mais recente, entre 11 e 16 de abril.
A queda tem sido praticamente contínua e é mais visível em pessoas a partir de 80 anos (80-84; 90-94; 95-99; 100 ou +). Esse grupo representava 22,46% das mortes ocorridas em SC entre 17 de janeiro e 23 de janeiro. Na semana de 11 a 16 de abril, tinha diminuído para 7,66%.
Veja os detalhes no gráfico abaixo, em que as faixas em cinza representam o percentual de mortes de pessoas de 0 a 59 anos na semana em questão, e as demais, em cores, representam faixas etárias que já estão recebendo a vacina.
Internações em enfermarias e UTIs
Conforme os dados da Secretaria de Estado da Saúde, a proporção de idosos entre os novos pacientes que dão entrada por semana em internações por covid-19 também vem em gradativa redução, especialmente para as pessoas acima de 80 anos.
Na semana que a vacinação começou, pessoas acima de 60 anos representavam 56,6% dos que davam entrada em internações em SC. Essa proporção caiu para 43,8% na semana de 15 de abril em SC. A variação é mais significativa ainda entre os idosos acima de 80 anos. Eles representavam 13% em janeiro e são agora 6%.
Veja os detalhes no gráfico abaixo, em que as faixas em cinza representam o percentual de pessoas de 0 a 59 anos que deram entrada em internações (enfermarias e UTIs) na semana em questão, e as demais, em cores, são faixas etárias que já recebem a vacina.
Internações em UTIs
Entre os indivíduos com sintomas severos que necessitam de leitos de terapia intensiva (UTIs), os dados também indicam gradativa redução da participação de pacientes com mais de 60 anos. Mas o movimento é mais evidente com pacientes a partir dos 80 anos.
Na semana que iniciou a vacinação em SC, em janeiro, pessoas com mais de 60 anos representavam 63,3% dos que davam entrada em UTIs por covid-19. Já na segunda semana de abril, o número foi de 55%. Pacientes com mais de 80 anos eram 12,6%, na semana passada eram 3,8%.
Veja os detalhes no gráfico abaixo, em que as faixas em cinza representam o percentual de pessoas de 0 a 59 anos que deram entrada em UTIs na semana em questão, e as demais, em cores, as faixas etárias que já recebem a vacina.
Em novos casos, no entanto, perfil de infectados teve pouca alteração
Já em novos casos de coronavírus, conforme a data do surgimento dos primeiros sintomas de covid-19, a situação praticamente não se alterou em comparação com janeiro em Santa Catarina. Pessoas com idades a partir de 60 anos representavam pouco mais de 14% dos novos infectados por semana, e idosos a partir de 80 anos eram 1,4%. Os números seguem praticamente iguais após 3 meses.
Taxa de letalidade cresceu em todas as faixas etárias, mas em menor ritmo nos mais idosos
Como a onda de infecção entre fevereiro e março foi a mais forte registrada em toda a pandemia, em todas as faixas etárias houve crescimento de casos e mortes em números absolutos, em comparação com meses anteriores.
Como o volume de mortes cresceu proporcionalmente mais rápido, a taxa de letalidade também aumentou em todas as faixas etárias. O índice mede o percentual de pessoas que morreram por covid-19 entre o total de infectados pelo coronavírus que tiveram exames confirmados.
Ainda que a letalidade seja muito alta entre os idosos – 1 em cada 4 infectados com 90 anos ou mais morre por covid-19; o mesmo acontece com 1 em cada 5 entre 80 e 89 anos –, a evolução proporcional entre janeiro e abril para essas faixas etárias foi mais lenta do que ocorreu nos pacientes com as demais idades.
Observe no gráfico abaixo como a curva da letalidade é mais empinada entre pessoas com idades entre 0 e 59 anos, e começa a declinar com pacientes acima de 60 anos, especialmente idosos com mais de 80.
Especialistas confirmam que há indícios de efeitos positivos da vacinação, mas que mais estudos são necessários
Ex-diretor do Departamento de Imunizações e Doenças Transmissíveis do Ministério da Saúde e pesquisador da Fiocruz, Julio Henrique Croda afirma que já se começa a observar em vários Estados alguns efeitos da vacinação, principalmente nos primeiros grupos vacinados, os de pessoas acima de 90 anos e 80 anos.
Superintendente de Vigilância em Saúde de Santa Catarina, Eduardo Macário afirma que, embora preliminares, já há indícios da eficácia da vacinação em profissionais da saúde e idosos, principalmente acima de 80 anos, um dos primeiros grupos a se vacinarem e que estão agora na fase da aplicação da segunda dose.
Ele ressalta que se observa redução no número de hospitalizações de casos graves de covid-19 e óbitos, especialmente entre indivíduos que tomaram as duas doses da vacina e cuja segunda aplicação ocorreu há mais de 30 dias.
“Ainda é cedo, mas já temos indícios preliminares que demonstram redução no número de casos graves e, principalmente, óbitos em relação a idosos acima de 80 anos. Isso pode ser explicado de duas formas: que essa população tem buscado se proteger mais contra o coronavírus, utilizando máscaras, evitando principalmente circular em ambientes aglomerados, mas também pode demonstrar uma eficácia da vacinação, porque esse grupo foi vacinado desde o início da campanha e já está agora tomando a segunda dose, ou seja, tem um nível de proteção maior.” – Eduardo Macário, superintendente de Vigilância em Saúde de SC
Conforme Julio Croda, é necessário ter um estudo individualizado com idosos que tomaram a vacina e os que não tomaram ainda para entender com mais clareza se a diminuição de internação e mortes nas faixas acima de 80 anos está relacionada à imunização do grupo ou ao maior cuidado que os pacientes têm tomado para se proteger do vírus. Estudo nesse sentido tem sido conduzido por ele com profissionais de saúde de Manaus, e as conclusões devem ser apresentadas em breve.
Vacina usada no Brasil é eficaz contra casos graves, mas faltam evidências de que impede contaminação
Usada em 80% dos casos, a vacina do consórcio Butantan-Coronavac demonstrou nos ensaios clínicos ter eficácia de 50% nas formas gerais da doença ede 78% a 86% para evitar as forma mais graves.
Eduardo Macário ressalta que a vacinação é importante para evitar casos graves de covid-19 e óbitos, mas ainda não há evidências de que pode prevenir infecções leves ou impedir a infecção da doença. Por isso, segundo ele, quando analisado o gráfico de novos casos, houve pouca mudança no perfil e na idade das pessoas infectadas pelo coronavírus, já quando se olha para internações e mortes, a tendência é proteger mais as faixas que já foram vacinadas há mais tempo.
– Se uma pessoa plenamente vacinada com duas doses, após 30 dias da segunda dose, tiver contato com o coronavírus, ela pode ser infectada, mas a tendência dela ter uma doença grave é bem menor, porque ela vai ter anticorpos suficientes para defender seu corpo contra aquele vírus. E ela pode, inclusive, transmitir, com uma capacidade bem menor, do que se não estivesse vacinada. A tendência é que quanto mais pessoas sejam vacinadas, o número de casos graves e hospitalizações, comece a reduzir – ressalta o superintendente.
Tipo de vacina aplicada impacta diretamente no tempo necessário para se obter resultados com a imunização
Julio Croda esclarece também que ainda não há um consenso sobre o tempo necessário para se alcançar resultados promissores com a vacinação, porque o resultado varia entre os países. Os tipos de vacina usadas no Brasil são menos eficazes do que as aplicadas nos Estados Unidos e no Reino Unido, por exemplo. Com isso, conforme a vacinação avança nos países, a tendência é de se observar os resultados em tempos distintos, mesmo que a mesma proporção de vacinados em relação à população tenha sido atingida.
“Quanto menor for a efetividade da vacina, mais lenta vai ser a redução da transmissão, do número de casos e dos óbitos. Por exemplo, o Chile tem a mesma taxa global de vacinação do que os Estados Unidos e o Reino Unido. Entretanto, ainda tem aumento expressivo de novos casos e de adoecimento nessa faixa etária. O Chile aplica as mesmas vacinas do que o Brasil: Coronavac e Astrazeneca. Então, o Chile é um bom modelo para a gente entender à medida em que a gente aumenta nossa cobertura vacinal como isso vai impactar na redução de casos e óbitos. Muito provavelmente mais lentamente do que em países que utilizam vacinas mais efetivas.” Julio Henrique Croda, ex-diretor de Imunizações e Doenças Transmissíveis do Ministério da Saúde e pesquisador da Fiocruz
Macário ressalta ainda que enquanto houver um número elevado de casos ativos, é importante a população manter as medidas de prevenção, como o uso de máscara, o isolamento social e a higiene das mãos, até que se possa alcançar uma margem de 80% da população vacinada.
Situação nas principais cidades de Santa Catarina
Entre as cidades ainda se vê muito pouco a variação expressiva. Florianópolis e Joinville, pelo menos, mostram melhor a redução de mortes e internações. Veja nos gráficos abaixo como está a situação em 10 das principais cidades de Santa Catarina.
Mortes
Internações
UTIs
Fonte: NSC