Minha paz a mim pertence!
Reflexões que ouvi ao longo da semana desembocam no texto de hoje. Diversas foram as ocasiões em que a frase do título fez parte da sessão de terapia de algum cliente/paciente. Atualmente, as pessoas sentem-se extremamente vulneráveis umas às outras, especialmente para aquilo que é destrutivo e apequenador. Inveja, cinismo, insinuações, perseguição, raiva, ódio… Em alguma medida, todos somos e nos sentimos vítimas dos venenos da convivência.
Perceber que minha paz a mim pertence, faz toda diferença ante ao esforço de não entregá-la a qualquer um. Qualquer um mesmo, soa absurdo inclusive, mas é real o fato de que nos entregamos mais facilmente aqueles que sequer compõe o rol de pessoas importantes para nossa vida. Aquela vizinha fofoqueira, o colega de trabalho mal-amado, os falsos amigos que somente buscam proximidade quando lhes serve.
Neste sentido, Epicteto, filósofo da escola estóica, nos oferece um questionamento que pode ser libertador, é algo como: “Se alguém entregasse teu corpo a quem chegasse, tu te irritarias. E porque entregas teu pensamento a quem quer que apareça para que, se ele te insultar, teu pensamento se inquiete e se confunda? Não te envergonhas por isso?”. Ai, como dói né? É, afinal, o que fazemos com frequência, entregamo-nos ao mal dizer alheio e autorizamos que o outro nos aniquile. Isto só pode acontecer enquanto eu não estiver em busca de conhecer a mim mesmo, enquanto eu estiver colaborando e concordando com aquele que pretende me ferir.
Ditado de mãe diz: “Tudo que começa com Eu, é problema seu”. Em partes é isto, se eu me ofendo, o problema é meu; Se eu concordo com o que dizem de mim, o problema é meu; Se eu sofro, o problema é meu. Nós nos entregamos demais. Falta compreendermos que não somos responsáveis pelo que sai da boca do outro e nem por calá-la, muito menos pelo que é feito na pretensão de me agredir, pelo que a realidade impõe e só pode ser como é. No entanto, somos inteiramente responsáveis pela importância que concedemos a isso.
Coaduna a reflexão de Marco Aurélio (Outro estóico! Eles eram bons em pensar sobre a vida boa e a convivência). Em suas meditações, ou solilóquios, ele sugere que é preciso prevenir-se, a cada amanhecer, de que, ao longo do dia, encontraremos intrometidos, mal-agradecidos, insolentes, astuciosos, invejosos e avarentos. E todos estes são vícios resultantes da ignorância quanto ao bem e o mal. Sabendo da beleza do bem e da vergonha do mal, nenhum dano o outro poderá me inferir. Marco Aurélio vai além, orienta a si próprio a não exacerbar-se, odiar ou agredir este outro, e de não fazê-lo por sermos todos aparentados de humanidade.
É isso, tudo que é belo e elevado é difícil. Se mantivermos isso próximo da consciência, talvez consigamos nos dispor melhor aos esforços para uma vida mais tranquila e uma convivência mais satisfatória. O segredo da vida não é o equilíbrio, mas o esforço em atribuir às situações sua real importância e encontrar a justa medida das coisas.
Solange Kappes
Psicóloga CRP 12/15087
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