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Quarentena e distanciamento social funcionaram contra o tifo no Gueto de Varsóvia

A praça Zelaznej Bramy, o muro do gueto e o palácio Lubomirski, no Gueto de Varsóvia, em 1941 (Foto: Knobloch, Ludwig/Creative Commons)

Nas condições mais adversas — superlotação, falta de higiene e a perspectiva de um inverno rigoroso — médicos do Gueto de Varsóvia conseguiram controlar em 1941 uma epidemia de tifo que ameaçava a população de 400 mil pessoas confinadas numa prisão de 2,2 quilômetros quadrados. Como? Com quarentena e distanciamento social, na medida do possível.

Um estudo de pesquisadores de Tel Aviv, Hong Kong, Amsterdã e Berlim, publicado na revista Science Advances, mostra que os internos do gueto na Polônia ocupada tiveram que agir por conta própria para combater a infecção, que encontrava no território denso e insalubre campo fértil para propagação.

As autoridades nazistas limitavam a entrada de alimentos e medicamentos com claro objetivo de dizimar mais rapidamente a população de judeus e ciganos. Biomatemático da Universidade de Tel Aviv e líder do estudo, o professor Lewi Stone queria determinar como a epidemia foi debelada, ao contrário do que ocorria em outros pontos da Europa, onde a doença adentrava pelo inverno.

Em dez meses, cerca de 120 mil prisioneiros foram contaminados e cerca de 30 mil morreram em decorrência direta do tifo. Mas o quadro melhorou subitamente graças à comunidade de 800 médicos e enfermeiros judeus que residiam no gueto. Entre os prisioneiros, havia cientistas e um indicado ao Prêmio Nobel, o bacteriologista polônes Ludwik Hirszfeld.

É dele um relato trágico sobre a correlação entre a doença e o nazismo, citado na pesquisa. “No caso da Segunda Guerra Mundial, o tifo é obra dos alemães, precipitado pela falta de comida, sabão e água. Então, quando 400.000 desgraçados são concentrados em um distrito e tudo é tirado deles, cria-se o tifo.”

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A resposta comportamental, contudo, pode influenciar o curso das epidemias. Além da quarentena de infectados, os profissionais e líderes comunitários promoveram cursos de treinamento para debelar a doença, numa escola de medicina que funcionava secretamente no subterrâneo do gueto. Um serviço de limpeza e uma oficina para a fabricação de sabão foram instalados pela comunidade, assim como banheiros públicos.

Em novembro, o número de novos casos era 40% menor. A curva achatou e apenas 10% da população do gueto estavam contaminados no inverno, para quando estava previsto o pico da doença. “Isso demonstra a plausibilidade de nosso argumento de que a epidemia do Gueto de Varsóvia por tifo foi interrompida pelas iniciativas de atividades antiepidêmicas da comunidade”, sustenta o estudo.

Este modelo, verificado em uma população sitiada, pode ser transportado para os dias de hoje, nas tentativas de conter a pandemia do novo coronavírus, que já infectou 16 milhões de pessoas e matou 650 mil. Basta levar em conta as taxas de mortalidade — 1 a 2% na Covid-19 em contraponto com 20% na epidemia de tifo dentro do gueto.

“Ambas as ações surgiram do mesmo medo e pânico, tipificando cidades nas garras de uma praga”, explicam os pesquisadores no artigo da Science Advances.

O estudo assinala ainda que provavelmente três vezes mais teriam contraído tifo não fossem as medidas preventivas adotadas pela comunidade. Quem sobreviveu, no entanto, acabou encontrando a morte em câmaras de gás dos campos de extermínio ou no massacre do Levante do Gueto de Varsóvia, em 1943, dois anos após a eclosão da epidemia de tifo.