Preocupados com a covid-19, os brasileiros não estão se protegendo de doenças cujas vacinas já existem e estão disponíveis gratuitamente pelo SUS (Sistema Único de Saúde) nos postos de saúde do Brasil. Conforme demonstram dados do Ministério da Saúde, o sarampo e a febre amarela continuam avançando no país em meio à pandemia do novo coronavírus.
Neste ano, já foram confirmados 4.958 casos de sarampo, número 34 vezes maior que o mesmo período do ano passado, quando foram registradas 142 pessoas com a doença. Trata-se de um aumento de 3.491%.
A cobetura vacinal de crianças de 1 ano, idade da primeira dose da tríplice viral (sarampo, caxumba e rubéola), é de 57,66%, de acordo com dados prelimiares. No ano passado, foi de 91,12%, ainda abaixo da meta de 95%.
Vale ressaltar que, em época de surto, como ocorre neste momento, há ainda a dose zero, recomendada de 6 a 11 meses de vida. Os dados sobre essa cobertura não foram divulgados pelo governo.
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Já em relação à febre amarela, foram notificados 881 casos suspeitos em humanos (18 já foram confirmados), além de 3.196 envolvendo a morte de macacos (358 confirmadas), o que indica que a doença continua circulando no país, se dispersando agora em direção à região Sul. O levantamento sobre a doença vai de julho de 2019 a maio de 2020.
Nenhuma das vacinas obrigatórias do Calendário Nacional de Vacinação, que incluem sarampo e fabre amarela, a crianças até um ano alcançou a meta de cobertura em 2019. A cobertura vacinal no país vinha caindo desde 2011, segundo o ministério, mas foi a primeira vez em 25 anos – desde que os dados são contabilizados – que o o país não atingiu a meta de vacinação de 95% em nenhuma das 15 vacinas.
Criado em 1973, o PNI (Programa Nacional de Imunizações) é considerado um dos melhores sistemas públicos de vacinação do mundo.
“Houve uma queda muito importante na taxa de cobertura vacinal no país durante a pandemia. Isso traz o fantasma do ressurgimento de doenças que já estavam erradicas. Para crianças, isso é um perigo muito maior do que a covid-19”, afirma o pediatra infectologista Marco Sáfadi, membro da Comissão Técnica para Revisão dos Calendários Vacinais da SBIm (Sociedade Brasileira Imunizações).
“O sonho de consumo do brasileiro é uma vacina contra a covid-19, mas ele se esquece de tomar outras vacinas que já existem para doenças muitos graves e que estão acontecendo como sarampo, meningite, doenças pneumocócicas, difteria, rotavírus, poliomielite, febre amarela, hepatite e catapora. Para tudo isso, há vacina na rede pública ofertada gratuitamente”, completa o pediatra Juarez Cunha, presidente da SBIm.
Cunha explica que ainda existe uma preocupação em relação a outras doenças, além do sarampo e da febre amarela, com vacina obrigatória, pois a vigilância epidemiológica está com toda a atenção voltada à covid-19.
“Então, nos preocupa, além da baixa cobertura vacinal, a situação das outras doenças, que não tem sido fácil para as vigilâncias acompanharem. Mas, até o momento, sabemos que sarampo, febre amarela e dengue, para a qual não há vacina, estão ocorrendo com maior frequência”, diz.
Os especialistas apontam o medo de ir até um posto de saúde durante a pandemia, correndo o risco de se expor ao novo coronavírus, como o principal motivo da queda na procura por vacinas.
“É uma razão até compreensível tirar a criança de casa para correr o risco de ser exposta ao vírus, mas não vacinar é um risco muito maior. O sarampo, por exemplo, pode ser mais grave em crianças do que a covid-19”, ressalta Sáfadi.
“Antes de existir a vacina, o sarampo era a principal causa de morte em crianças. Mesmo na quarentena, a dose zero continua sendo fundamental. Crianças não saem de casa, mas há sempre alguém da família que circula, vai para supermercado ou farmácia e pode trazer a doença”, completa Cunha.
O sarampo é um exemplo de como a baixa cobertura vacinal pode levar ao retorno de doenças erradicadas. Considerado eliminada em 2016, ele voltou a circular no Brasil em 2018. Os jovens concentram o maior número de casos, mas a maior incidência e número de mortes ocorre em crianças, afirma Cunha.
“O sarampo é uma doença extremamente grave especialmente em crianças. Diferentemente da covid-19, que infecta de duas a três pessoas, é capaz de infectar de 18 a 20”, explica. “Vinte e um Estados do país já relatam notificações de sarampo e continuamos em surto de sarampo em praticamente em todo o Brasil, mesmo durante a quarentena”, completa.
Neste ano, já foram notificadas cinco mortes, segundo o boletim epidemiológico de 20 de junho divulgado na sexta-feira (10). Pará, Rio de Janeiro, São Paulo e Santa Catarina concentram o maior número de casos, sendo que 50% das mortes ocorreram no Pará.
Devido a esse surto, o Ministério estabeleceu a dose zero da vacina que deve ser dada em bebês de 6 a 11 meses. O objetivo é antecipar a proteção dessa faixa etária, mais sujeita a complicações da doença. A primeira dose é ministrada aos 12 meses e a segunda, aos 15 meses de vida.
Outra campanha da pasta, ainda em andamento, é a de vacinação contra a gripe. Até o momento, atingiu 90% da meta de cobertura do público-alvo. A melhor cobertura foi registrada em idosos (119%) e a pior em gestantes (63%) e crianças até cinco anos (64%). Para evitar o desperdício de imunizantes, a pasta orientou aos municípios que estendesse à vacinação a toda a população até o final do estoque.
O presidente da SBIm chama a atenção para a febre amarela, que também dispõe de vacina e teve surtos registrados nos últimos anos no Brasil. A doença é endêmica na região Norte e Sudeste. “É outra doença que temos que estimular a vacinação”, afirma Cunha. A vacina é preconizada aos 9 meses de vida.
Tendo em vista o impacto da covid-19 na vacinação de rotina, a SBIm, junto à SBP (Sociedade Brasileira de Pediatria) e o Unicef (Fundo das Nações Unidas para a Infância), elaborou uma cartilha com orientações para realizar as imunizações com sergurança.
Para manter as vacinas de rotina durante a pandemia, o especialista orienta a entrar em contato com o posto de saúde previamente para averiguar quais são as medidas de segurança adotadas, por exemplo, se há uma sala de espera para vacinação separada dos demais pacientes e horários diferenciados para crianças e ainda a possibilidade de agendamento, já que crianças com menos de 2 anos não podem usar máscaras, recurso que ajuda na proteção contra a covid-19.
Fonte: R7