O adiamento das eleições municipais de 2020 por causa da pandemia do novo coronavírus está em pauta no Congresso. O Senado aprovou em dois turnos na terça-feira (23) o texto da PEC (Proposta de Emenda à Constituição) que trata do tema. A proposta define os dias 15 e 29 de novembro para a realização das duas etapas do pleito municipal em todo o país.
Foram 67 votos favoráveis, 8 contrários e 2 abstenções. O texto agora precisa ser aprovado também em dois turnos na Câmara dos Deputados, onde necessita do apoio de pelo menos três quintos dos parlamentares (308 votos dos 513). Não é necessária sanção presidencial.
O calendário eleitoral atual estabelece o primeiro e o segundo turnos das eleições, respectivamente, nos dias 4 e 25 de outubro. A proposta de mudança da data ocorre em um momento de incertezas sobre as condições sanitárias do país para realizar a campanha e as votações em meio à pandemia.
Nas eleições de 2020 serão escolhidos prefeitos e vereadores, com regras diferentes. O pleito para chefe do Executivo municipal obedece ao sistema majoritário: o candidato com a maioria dos votos vence; nos casos de municípios com mais de 200 mil habitantes, se primeiro colocado não tiver a maioria dos votos válidos, faz-se o segundo turno entre os dois mais votados.
Já a dos membros dos Legislativos municipais segue o sistema de eleição proporcional. Nela, assim como acontece com deputados federais e estaduais, as vagas na Câmara são ocupadas levando em consideração o total de votos recebidos pelo partido ou coligação dos candidatos.
Apesar da aprovação na PEC do Senado, sob relatoria do senador Weverton Rocha (PDT-MA), o adiamento ainda não é consenso. Entidades da sociedade civil, senadores, deputados e o presidente do Tribunal Superior Eleitoral, ministro Luís Roberto Barroso, têm se manifestado sobre diferentes alternativas para a realização das eleições.
Possibilidades em debate
4 E 25 DE OUTUBRO
Datas do 1º e 2º turno que constam no Código Eleitoral, mas que dificilmente serão respeitadas. Barroso tem ouvido de médicos e infectologistas que ainda não há garantia de que a situação da pandemia estará mais controlada no início de outubro.
15 E 29 DE NOVEMBRO
São as datas que estão na proposta do Senado na PEC sob relatoria do senador Weverton Rocha (PDT-MA) e assinada por 27 parlamentares. O texto aprovado contraria a vontade do TSE, que havia sugerido a realização do 2º turno em dezembro. Por ser uma emenda à Constituição, precisa ser aprovada em dois turnos no Senado e na Câmara.
2022
A Confederação Nacional dos Municípios defende o adiamento das eleições para 2022, o que unificaria o pleito ao de presidente, governador, senador, deputado federal e deputado estadual. A ideia foi descartada pelo TSE, que organiza as eleições, e não quer prolongar mandatos.
Quem decide sobre as datas da eleição
A determinação das datas das eleições está prevista na Constituição Federal como o primeiro e o último domingo do mês de outubro. Ou seja: para realizar qualquer alteração é preciso mudar a carta magna, o que exige uma PEC (Proposta de Emenda à Constituição).
O TSE (Tribunal Superior Eleitoral) é o órgão máximo da Justiça Eleitoral. Ele está acima dos Tribunais Regionais Eleitorais, que estão presentes nos estados e são responsáveis por organizar as eleições.
Cabe ao TSE executar as regras determinadas pela Constituição e pela lei 9.504/1997, popularmente conhecida como Lei das Eleições, que estabelece as normas para os pleitos.
A PEC, além de mudar as datas das eleições, permite que o plenário do TSE defina um novo cronograma para o pleito em cidades que não tiverem condições sanitárias para votação em novembro.
A decisão pode partir do próprio TSE ou por questionamento dos presidentes dos Tribunais Regionais Eleitorais. Autoridades sanitárias deverão ser consultadas antes da definição.
Outras datas modificadas na proposta do Senado
REGISTRO DE CANDIDATURAS
O texto da PEC propõe modificação na data atual, prevista para 15 de agosto. Agora, os partidos poderão solicitar à Justiça Eleitoral o registro dos candidatos até 26 de setembro
CONVENÇÕES
Pelo atual calendário eleitoral, as convenções partidárias devem ser realizadas entre 20 de julho e 5 de agosto. O TSE autorizou a realização dos eventos de forma virtual, para evitar aglomerações. O texto a PEC determina que as convenções ocorram entre 31 de agosto e 16 de setembro
PRÉ-CANDIDATOS NA TV
A partir de 11 de agosto, emissoras ficam proibidas de transmitir programa apresentado ou comentado por pré-candidato, sob pena de cancelamento do registro do beneficiário
DESLIGAMENTO
15 de agosto é o prazo para o desligamento daqueles que quiserem disputar os cargos de prefeito ou vice-prefeito
PROPAGANDA ELEITORAL
26 de setembro será o novo início da propaganda eleitoral, inclusive na internet
HORÁRIO GRATUITO
O período de veiculação do horário eleitoral gratuito no rádio e na televisão vai de 27 de setembro a 12 de novembro
INFORMAÇÕES FINANCEIRAS
Até 27 de outubro, partidos políticos, coligações e candidatos devem divulgar informações financeiras, como relatório de transferências do Fundo Partidário e do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (Fundo Eleitoral)
PRESTAÇÃO DE CONTAS
15 de dezembro é a data limite para o encaminhamento à Justiça Eleitoral do conjunto das prestações de contas de campanha
PRAZO FINAL
27 de dezembro é a data limite para realização de eleições em municípios muito afetados pela pandemia que precisem mudar a data dos pleitos
Os cálculos políticos que embalam o debate
Embora a justificativa para o adiamento das eleições sejam questões sanitárias, a discussão também envolve cálculos políticos. De forma geral, Senado e Câmara divergem sobre as possíveis mudanças no calendário eleitoral.
O presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ) tem defendido o adiamento das eleições, mas sua posição enfrenta resistência. Na quinta-feira (18), ele disse: “Hoje, eu vejo assim: o Senado tem uma maioria para aprovar. A Câmara ainda está muito dividida e acho que hoje ainda não tem número para isso.”
Segundo Maia, a pressão contra o adiamento viria de prefeitos que buscam a reeleição. Pelas limitações sanitárias, manter o pleito em 4 de outubro beneficia quem está no cargo e prejudica quem precisa fazer campanha, diz o parlamentar. “Eu não sei como alguém que não está no cargo conseguiria fazer campanha em agosto e setembro nessa situação. Como vai chegar até a sociedade?”
A fragmentação encontrada na Câmara impediu, inclusive, a constituição de uma comissão mista entre deputados e senadores para debater o adiamento. Segundo a BBC Brasil, a maior resistência está nos partidos que integram o chamado centrão, grupo informal de parlamentares sem posição ideológica que negociam espaço no governo em troca de apoios relevantes em votações de interesse do Palácio do Planalto.
Segundo a coluna Painel, do jornal Folha de S.Paulo, o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), foi o responsável pela articulação que garantiu a maioria na casa pelo adiamento das eleições. O senador, segundo o jornal, avalia alternativas para seguir na presidência da Casa após fevereiro de 2021, quando termina seu mandato.
Uma dessas possibilidades seria uma ação no Supremo Tribunal Federal para permitir um mandato de presidente do Senado com duração de dois anos, que conciliaria com as eleições de senadores em 2022. A tese precisa ser apresentada à corte por outro partido. O expediente já foi utilizado por Antônio Carlos Magalhães em 1999.
Ao apoiar o adiamento das eleições, Alcolumbre estaria tentando cativar os ministros do Supremo que estão no TSE – além de Barroso, Alexandre de Moraes e Edson Fachin integram o tribunal eleitoral – para a eventual ação que visa sua recondução no cargo.
O embate em torno da extensão de mandatos
O adiamento defendido pelo TSE e aprovado no Senado garante que as eleições ocorram ainda em 2020, para evitar que os atuais mandatos de prefeitos e vereadores sejam prorrogados por mais de quatro anos, uma possibilidade aventada por alguns grupos.
A Confederação Nacional dos Municípios, organização apartidária sem fins lucrativos que reúne prefeitos e ex-prefeitos, defende o adiamento das eleições com uma extensão de mandatos por mais dois anos. Assim, todas as eleições aconteceriam de forma unificada em 2022, quando ocorre o pleito presidencial.
Para presidente da entidade, Glademir Aroldi, “o Brasil não reúne condições sanitárias, sociais, econômicas e jurídicas para manutenção das eleições em 2020. Não temos garantia sanitária nenhuma”.
No dia 15 de maio, organizações da sociedade civil lançaram a campanha “Eleições Seguras – Democracia é atividade essencial”. O documento foi assinada por entidades como Programa Cidades Sustentáveis, a Rede Nossa São Paulo e o Pacto pela Democracia.
As organizações defendem a manutenção das eleições em 2020 e dizem que uma possível prorrogação de mandatos pode gerar “precedentes absolutamente indesejáveis para o funcionamento do regime democrático”.
O texto defende que as eleições podem ser feitas em segurança seguindo algumas medidas: determinação de horários de votação preferenciais aos cidadãos pertencentes aos grupos de risco da doença e a criação de protocolo de higienização constante dos ambientes e materiais utilizados durante a votação.
Fonte: Nexo Jornal