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Gestores digitais em ascensão

Fonte: Suryara Bernardi

As redes sociais redefiniram a maneira como empresas e instituições se conectam com seus públicos. Responsável por organizar campanhas, mediar interações ou mesmo formular estratégias em cenários de grande concorrência, a gestão de mídias sociais passou a exigir de seus profissionais conhecimentos que vão além da produção e divulgação de conteúdos, envolvendo compreensão mais aprofundada sobre comércio eletrônico, análise de dados e de métricas sobre o comportamento dos consumidores nas redes.

De acordo com levantamento divulgado este ano pelo LinkedIn – rede social especializada em negócios e inserção profissional –, a carreira de gestor social está em primeiro lugar na lista das 15 ocupações com maior expansão desde 2015. A lista também traz outras nove atividades ligadas ao campo da tecnologia da informação, como engenharia de cibersegurança e engenharia de dados.

Em resposta à crescente demanda por gestores de mídias sociais, começam a surgir programas de formação específicos para a área, tanto na graduação como na pós-graduação.

Requisitados para trabalhar em agências de comunicação e publicidade, departamentos de marketing, portais de comércio eletrônico e instituições de diferentes áreas, os gestores de mídias sociais também podem montar seus próprios negócios, oferecendo serviços que vão desde a formulação de estratégias de comunicação até a mediação de conflitos em comunidades digitais.

“Em casos de pandemia, como a provocada pelo novo coronavírus, torna-se ainda mais importante a formação adequada desses profissionais, que têm de se informar muito bem para repassar aos usuários das redes dados, por exemplo, de como se proteger de doenças e minimizar os efeitos da propagação de notícias falsas”, explica Carol Garcia, coordenadora do curso de mídias sociais digitais do Centro Universitário Belas Artes de São Paulo.

Desde 2015 a instituição oferece graduação tecnológica em gestão de mídias sociais. Com duração de dois anos, o curso reúne disciplinas teóricas e práticas como antropologia cultural, fotografia digital, web design, práticas de jornalismo on-line, neurociência e comportamento.

“Criamos essa graduação a partir da percepção de que muitas empresas possuem em seus quadros pessoas formadas no ambiente de marketing tradicional, que conhecem muito sobre a própria empresa e seu público-alvo, mas não dominam as novas tecnologias”, explica Garcia.

Preocupadas em se aproximar de seus clientes, as organizações enxergam nas redes sociais um poderoso meio de interação, fazendo de seu uso uma ferramenta para traçar estratégias de mercado e identificar as necessidades dos consumidores. “É impossível pensar em uma empresa que consiga sobreviver atualmente fora do ambiente digital”, afirma Mitsuru Higuchi Yanaze, coordenador do curso de marketing digital da ECA-USP (Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo).

Oferecido como curso de EaD (extensão na modalidade de ensino a distância), o programa reúne conteúdos como estratégias de redes sociais, ferramentas de SEO (Search Engine Optimization), comportamento do consumidor na web e ética e legislação aplicadas à internet.

Com duração de três meses e direcionado para quem está realizando ou já possui uma graduação, o curso tem sido procurado por profissionais de marketing, comunicação e gestores empresariais.

Ao destacar a complexidade que envolve a gestão das mídias sociais, Yanaze lembra da necessidade de ir além do treinamento no uso de ferramentas e softwares, fazendo com que o aluno consiga, antes de tudo, interpretar os dados que irá utilizar.

“Conhecer os modelos de análise permite que o profissional trabalhe com mais segurança frente à avalanche de dados que caracteriza o momento atual”, avalia.

Ciência nas redes

Amplamente utilizadas por empresas privadas, as redes sociais também servem como um meio de comunicação oficial de instituições de diversos segmentos. Presente nas principais plataformas, a USP, por exemplo, utiliza esses ambientes para divulgar notícias de cunho científico e informações institucionais de interesse público.

“Fazemos entre 10 e 15 postagens diárias, sempre levando em conta o que está em pauta no momento”, afirma Denis Pacheco, responsável pela comunicação da universidade no Facebook, Twitter e LinkedIn.

Para produzir os conteúdos divulgados nos canais, Pacheco considera fundamental o conhecimento sobre softwares de edição de fotos e vídeos, bem como o uso de métricas e de inteligência analítica, que possibilitam mensurar o envolvimento dos usuários com as postagens, analisar e interpretar os dados gerados pelas redes. “Como cada mídia tem sua particularidade, é preciso elaborar materiais distintos”, explica.

A interação que se dá no âmbito das plataformas digitais tem atraído a atenção de pesquisadores interessados em compreender com mais profundidade o comportamento de consumidores que utilizam as redes.

“A construção da imagem e da identidade de uma marca depende da estratégia que ela define para atuar nessas mídias”, observa Lucia Barros, professora da FGV-Eaesp (Escola de Administração de Empresas de São Paulo da Fundação Getulio Vargas), que desde o ano passado vem investigando o ativismo de marcas nas redes sociais.

A partir da constatação de que as marcas hoje precisam se posicionar em relação a causas sociais, econômicas, políticas, ambientais, dentre outras, são comuns as dúvidas sobre como reagir a posturas indesejadas de clientes, como mensagens preconceituosas ou que disseminam ódio, por exemplo – e que, por serem acompanhadas por grande audiência, não podem ser simplesmente ignoradas.

O estudo busca analisar os efeitos gerados por respostas institucionais a comentários controversos, em distintas temáticas. “Algumas empresas hoje se comunicam com seus clientes de forma antropomorfizada, ou seja, se comportam como se fossem um ser humano”, informa a pesquisadora.

Exemplo dessa prática está na criação de personagens para realizar atendimento em sites e em redes sociais. “Essa postura costuma ser bem-aceita, pois os clientes enxergam a marca de forma mais humana e tendem a identificar-se mais com ela”, completa.

Barros ressalta que, apesar de muitas vezes ter autonomia para administrar conflitos dessa natureza, o gestor deve estar alinhado com as estratégias adotadas pela organização. “É preciso atenção para manter a unidade entre os diversos meios de comunicação. Não adianta a marca dizer uma coisa na televisão e agir de forma diferente nas redes sociais ou mesmo nos pontos de venda”, analisa.

Produzir conteúdos que, além de relevantes, sejam entendidos pelo público em geral se tornou um dos grandes desafios enfrentados pelos gestores de mídias sociais. “A produção escrita utilizada para comunicar socialmente deve estar atenta à questão do letramento digital dos usuários”, explica Marcelo El Khouri Buzato, professor do IEL-Unicamp (Instituto de Estudos da Linguagem da Universidade Estadual de Campinas).

Se no passado as dificuldades de se relacionar com a tecnologia se concentravam no manuseio de aparelhos eletrônicos, hoje elas se expandem para a capacidade de interpretação crítica das mensagens, que pode variar de acordo com os diferentes níveis de letramento. “A reflexão sobre os efeitos e as funções do uso social das ferramentas pode ser decisiva na transposição dessas barreiras”, diz.

Mercados locais

A gestão de mídias sociais também tem sido valorizada no desenvolvimento de atividades produtivas em âmbitos regionais. Ao constatar a relevância da produção econômica e cultural da cidade de Caruaru, a UFPE (Universidade Federal de Pernambuco) resolveu implantar, em 2015, o curso de comunicação social com ênfase em mídias sociais e produção cultural no CAA-UFPE (Centro Acadêmico do Agreste).

Oferecido como bacharelado de quatro anos, o curso foi estruturado a partir de características da região, que reúne, em sua maioria, atividades da área têxtil, do setor moveleiro, da indústria de laticínios, além da produção de artesanatos.

“Ao término da graduação, os profissionais saem preparados para inserir essa cadeia de arranjos produtivos na esfera da comunicação”, afirma Diego Gouveia, coordenador do curso.

Com proposta de formação mais generalista, o curso da UFPE trabalha para que profissionais tenham maior domínio das distintas linguagens – como a produção de conteúdo em áudio e vídeo – do que sobre suportes específicos, como rádio e televisão. “Isso para que os alunos tenham uma visão mais empreendedora e não se limitem a procurar trabalho nos veículos de comunicação tradicionais”, avalia.

Fonte: Nexo Jornal