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Mank: melhor filme de 2020?

Por Briann Ziarescki Moreira

Estreou no último dia 4 de dezembro na Netflix, o décimo primeiro filme dirigido por David Fincher, e isso por si só, já é uma grande ocasião. Como fã confesso do diretor (o mesmo de Seven, Clube da Luta, Zodíaco entre outras produções sensacionais), aguardava com particular ansiedade a estréia do longa Mank, estrelado pelo sempre incrível Gary Oldman, Amanda Seyfried, Lily Collins, Charles Dance e cia, que prometia ser o melhor filme do ano. Correspondeu às expectativas? Vamos ver.

Fui assistir ao longa utilizando-me do método da ex-presidenta Dilma Rousseff: não estabeleci uma meta, apenas deixei uma meta em aberto e Fincher, como sempre, conseguiu dobrar essa meta. O diretor é conhecido por sua quase compulsão com os detalhes, possibilitando em suas produções um grau de excelência acima da média e em Mank não é diferente.

Meu enamoramento com o longa começou por sua belíssima fotografia em preto e branco, que acende a estética dos anos 30 na produção. O tom noir permeia cada detalhe do filme, incluindo os famosos planos baixos durante os diálogos, as transições com total fade-out e a utilização perfeita das sombras, tanto nos cenários quanto nos personagens. Tudo foi extremamente calculado para oferecer aos espectadores uma experiência única de imersão à velha Hollywood.

Não satisfeito, Fincher dá um passo além e utiliza-se de elementos externos para aumentar o nível de sua obra como o pôster com design vintage e até mesmo marcas de cigarro em certas cenas, que remetem ao tempo em que os operadores fumavam enquanto trocavam os rolos de filmes nos cinemas. É realmente uma carta de amor ao cinema clássico, ou será que não?

Enquanto que tecnicamente o filme realiza toda uma homenagem ao cinema do início do século XIX, seu enredo é uma crítica tanto aos grandes estúdios quanto à indústria cinematográfica da época. A trama gira em torno da construção do roteiro de Cidadão Kane, filme dirigido, estrelado e “co-escrito” por Orson Welles, um dos maiores astros da história do cinema norte-americano.

O argumento, que é considerado até os dias atuais como o melhor já feito para uma produção cinematográfica, é creditado a Herman Mankiewicz, um dos grandes roteiristas da era de ouro do cinema hollywoodiano. Os meandros da vida de Mank são dispostos em cena por meio de flashbacks – muito bem colocados por sinal – e o processo de escrita de Cidadão Kane (cujo qual se tornou extremamente penoso para o roteirista devido ao seu vício em álcool), que culminam na disputa pelos créditos do texto com Welles.

Oldman oferece uma interpretação digna de Oscar em Mank, onde repleto de maneirismos, o ator entrega diversos diálogos e monólogos sensacionais com tamanha precisão que o fazem sumir por detrás do personagem, dando vida ao protagonista. Auxiliado por um elenco primoroso e empenhado, o filme gira em torno do personagem que dá nome ao longa, mas sem esquecer das subtramas dispostas na trajetória, tendo tempo em cena para cada personagem secundário brilhar.

O controle de Fincher possibilita ao longa garantir ritmo e fluidez as mais de duas horas de duração, sendo auxiliado pela brilhante trilha sonora composta pela dupla Trent Reznor e Atticus Ross. Já conhecida pelo diretor em produções anteriores, como em Millennium: Os Homens Que Não Amavam as Mulheres (2011), Garota Exemplar (2014) e A Rede Social (2010) que rendeu aos compositores o Oscar de Melhor Trilha Sonora, a escolha novamente se mostrou perfeita em Mank.

Em um ano extremamente difícil para o cinema, com diversas produções sendo canceladas e adiadas, Mank é uma grata surpresa. Um respiro cinéfilo no último mês do ano. Fincher correspondeu às expectativas e entregou um de seus melhores trabalhos, com muito cuidado e irretocável talento. O mesmo vale para Oldman que, de toda a sua brilhante carreira, sua interpretação em Mank merece ser exaltada. Com tantos acertos, acredito que a pergunta inicial está respondida: melhor filme do ano com merecidos méritos! Encerro esse texto com essa comovente citação que por sinal também encerra o filme:

“Eu pareço ter me tornado um rato numa ratoeira feita por mim, uma ratoeira que conserto sempre que percebo o perigo de uma abertura que me permita escapar.”

Herman Mankiewicz