Cinemarelo
Pegue uma grande quantidade de vermelho. Adicione aos poucos verde e, com moderação, misture até surgir os primeiros traços quentes dessa cor primária: o amarelo. O caminho inverso de construção desta coloração que costuma ser formadora de outras, pode parecer estranho no início, mas ajuda a entender que tudo possui um começo. Seja material ou imaterial, entender a origem do que porventura sempre esteve ali, nos faz compreender mais sobre o todo e, por extensão, nós mesmos.
Abarcar toda a vasta imensidão da mente humana, é um desafio que a psicologia tenta explicar desde os primórdios da medicina. A odisséia em busca do entendimento de nossas próprias emoções, perpassa desde o descobrimento das leves sinfonias de sinapses causadoras da alegria, até os sensíveis impulsos nervosos que nos trazem a melancolia. Nesse caminho, descobrimos por exemplo que a coloração amarela nos faz sentir otimismo, entusiasmo e alegria, assim como ambientes fechados, solitários e sem cor, podem causar tristeza profunda e até mesmo a depressão.
Assim surge o Setembro Amarelo, campanha organizada anualmente que possui como objetivo alertar sobre a triste realidade daqueles que se sentem sozinhos, deslocados, tristes e fora de rumo. O Setembro Amarelo existe para salvar as vidas assoladas pela depressão, a começar por entender como identificar os sintomas da doença e assim buscar o tratamento. Existem muitas maneiras de compreender o estado depressivo, mas todas iniciam-se na visualização de como a depressão pode agir na vida das pessoas, o que ela afeta e o porquê dela surgir em nossas vidas.
Com isso em mente, preparei uma lista de cinco produções que são um estudo sobre as emoções humanas, com ênfase na depressão. Lembre-se: você não está sozinho.
Ela (2013):
Qual melhor companhia que meu próprio smartphone? Sei que tal pensamento já passou pela sua mente. Munido de todos os apetrechos tecnológicos possíveis, como haverá espaço para a solidão? Bem, o mundo moderno logo trata de responder esse questionamento ao escancarar o paradoxo da tecnologia: o encurtamento das distâncias que nos deixa cada vez mais distante.
É esse viés que Spike Jonze busca trazer para discussão, na sensível comédia-dramática/ficção científica Ela de 2013. Ao longo do filme, somos imersos nessa realidade solitária do protagonista, estrelado pelo brilhante Joaquin Phoenix, que chega ao ponto de se apaixonar por uma inteligência artificial que lhe faz companhia.
Com doçura o diretor, que também assina o roteiro da produção, consegue demonstrar um entendimento coeso sobre as relações interpessoais da atualidade. Na ficção vemos em cena a realidade de que, cada vez mais afastados e dependentes da tecnologia, a solidão surge de maneira inevitável em nossas vidas. Em uma produção tão singela, é possível entender mais sobre nossa própria solitude, e assim, como podemos superá-la.
As Vantagens de Ser Invisível (2012):
Ansiedade. Aquela sensação que sufoca, prende e isola milhares de pessoas. Conviver com esse sentimento é difícil, ainda mais quando se desconhece sua real periculosidade. As Vantagens de Ser Invisível, longa de 2012 estrelado por Logan Lerman, Ezra Miller e Emma Watson, traz em seu enredo as dificuldades que muitos jovens e adolescentes enfrentam: solidão, tristeza, dificuldades em se encaixar, ansiedade e depressão.
Baseado no livro de mesmo nome, o filme nos conduz sob o olhar do protagonista para dentro da vivência de alguém que por mais que tente, não consegue ser feliz. Carregada de dor, a jornada de superação é tecida a partir do enfrentamento dos traumas e posterior libertação dos mesmos.
O longa nos ensina que, apesar de não conseguirmos mudar o passado, fazemos nosso futuro. Podemos construir novas memórias, uma nova família, edificar nossa própria felicidade. “Eu sei que tem pessoas que dizem que essas coisas não acontecem, e que isso serão apenas histórias um dia. Mas agora nós estamos vivos. E nesse momento, eu juro. Nós somos infinitos.”
Divertida Mente (2015):
Já olhou para alguém e pensou: o que será que se passa na cabeça dela? É exatamente essa pergunta que a animação Divertida Mente de 2015, busca responder. Clássico absoluto da Disney/Pixar, a produção traz um olhar didático a respeito de nossas emoções e o funcionamento de nossa mente. De forma leve, o longa inova ao mostrar como as mais diversas situações atingem nosso cérebro, influenciam nossos sentimentos e ajudam a moldar nosso caráter.
O filme acompanha a pré-adolescente Riley que, em plena fase de mudanças comportamentais e físicas, passa por uma experiência complexa e de complicada adaptação. Somos levados por essa jornada de autoconhecimento, onde na busca pelo entendimento de si mesma, a protagonista e suas emoções (Alegria, Tristeza, Raiva, Medo e Nojinho), passam por um processo doloroso e inevitável: o amadurecimento.
Indiscutivelmente comovente, Divertida Mente não é apenas mais uma animação infantil. Sendo um complexo estudo de nossa própria vivência, o longa possibilita de maneira inovadora e bela o entendimento que somente ao entender nossa própria situação e encará-la de frente, conseguimos enfim, seguir em frente.
O Babadook (2014):
Talvez o filme mais visceral desta lista, O Babadook de 2014 é um drama de terror escrito e dirigido por Jennifer Kent. Aterrorizante, o longa traz a literal personificação dessa entidade sombria e eterna: o luto. O ser humano busca desde a primeira ida, saber lidar com aquilo que não tem mais volta. A morte é algo que permanece conosco, faz nossa tristeza transbordar e fluir durante toda nossa vivência.
É nessa existência que a protagonista vive. Triste e solitária, sua pesarosa rotina vai esgotando cada vez mais sua sanidade, a ponto de não conseguir evitar a entrada do Babadook. Involuntariamente, ela machuca quem mais importa em sua vida pois não consegue mais lidar com o peso da depressão sozinha. O Babadook a venceu.
Desta maneira perspicaz, a diretora transpassa as convenções de gênero e vai até o terror para transmitir sua mensagem. Aprendemos juntamente com a protagonista que não é possível se livrar do Babadook, assim como não conseguimos abandonar o luto. Perceber tal alegoria torna o filme muito menos aterrorizante, do mesmo modo que conseguir conviver com a perda faz a dor diminuir. Prometo que faz.
Pequena Miss Sunshine (2006):
“Ohana quer dizer família. Família quer dizer nunca abandonar ou esquecer.” Sim eu sei, essa frase não é desse filme. Mas encaixa-se perfeitamente com o que a comédia dramática Pequena Miss Sunshine de 2006 tenta transmitir. Em meio às dificuldades de convivência que uma família disfuncional possui, a trama desenrola-se durante uma longa e penosa viagem em busca de esperança.
Todos naquela Kombi amarela embarcaram com o objetivo de, ao menos por um momento, esquecer os problemas e tristezas que a vida acarreta e apenas perseguir o puro sonho de uma criança. A pequena miss, interpretada magistralmente por Abigail Breslin, é o fio que une toda a esperança dessa família e faz a ponte entre o público e os outros personagens, cada qual com suas particularidades e tribulações.
O longa vencedor do Oscar de melhor roteiro original, consegue tratar temas como depressão, revolta, perda e derrota, da mesma maneira com a qual todos lidamos. É um reflexo de nossa própria condição ao menos tentar. Nas idas e vindas da vida, o que nos resta além das tentativas, falhas e consecutivos reveses? Aceitação. E é essa lição que esse belo filme traz, sem estereótipos ou inverossimilhança. É a vida, como ela é.
Tudo bem não se encaixar. Tudo bem não estar bem o tempo todo. Você não está sozinho. Espero que esses filmes tragam certa luz a sua vida, ou ao menos ilumine o que precisa ser visto. Boas sessões e boa vida!
Por Briann Ziarescki Moreira