Por que viver se vamos morrer?
Quando recebi essa pergunta como sugestão de tema para a escrita, senti aquele inevitável desconforto no fígado que acontece quando nos deparamos com grandes questões que regem a nossa vivência, e para as quais não há uma única resposta possível ou definitiva. Pois bem, pergunta semelhante à essa do título é fundadora do pensamento filosófico, ou seja, das reflexões possíveis de se fazer, é a mais antiga e a mais relevante de todas. Afinal, tudo fica insignificante diante de uma vida ruim, triste ou apequenadora. Dessa forma, a tentativa de resposta que segue no texto, não poderia ser senão por intermédio da filosofia.
Que paradigma insuperável é este de pensar sobre a vida que “vale a pena”, certo? O que é que nos faz pensar e avaliar que vale viver, que há saldo, ganho de potência ou alegria em viver, diante das penas, dores, sofrimentos e derrotas que o existir nos impõe? Algumas possibilidades se apresentam, pensem comigo. A máxima socrática do Conhece a ti mesmo é um dos caminhos possíveis.
Conhecer-se é necessário para que sejamos capazes de identificar nossas virtudes, talentos, aptidões ou o nome que se quiser dar pra uma potencialidade natural para alguma coisa. Então, a vida que vale ser vivida pode ser aquela em que somos capazes de identificar nossos potenciais e trabalhar para o aperfeiçoamento ou a perfectibilidade daquilo que já é nosso. Aristóteles explicaria que isto se trata da busca pela excelência.
Também é possível encontrar sentido na vida por intermédio do prazer, melhor ainda, pela capacidade de conservar a fruição. Aqui a proposta é complexa, especialmente se considerarmos que vivemos em tempos onde o prazer se dá nos excessos, resultando em uma sofisticação da vida. Isto é, acabamos nos tornando exigentes nos prazeres e incapazes de conservar o gozo na simplicidade. Em resumo, a vida passível de satisfação pode ser aquela em que se consegue praticar algum desapego e manter o prazer no simples.
Ao que parece, é preciso também que sejamos capazes de nos conformar com a contingência, com tudo aquilo que está dado e não pode não ser, ou não pode ser de outra forma. Capacidade de compreender a vida como ela é, aceitando amorosamente seus contornos imperfeitos e o que ela for nos imputar de sofrimentos. Gosto de utilizar os três “is” para explicar melhor, isto é, ser capaz de aceitar o que é Inexorável, Inevitável e Inadiável.
É também caminho possível o de produzir sentido para a própria vida por intermédio da vida dos outros. Aquela em que aceitamos uma redução da nossa própria força ou potência para que a do outro possa surgir. Uma vida dedicada aos outros pode parecer uma vida em que perdemos para que os outros possam vencer, quando na realidade, permitimos e estimulamos que o outro se desenvolva e, com isso, podemos nos alegrar e vencer junto, afinal, fomos instrumento para a vida boa do outro. Talvez aqui esteja a forma mais complexa de atribuir sentido à vida.
Por fim, estamos habituados a uma modernidade histérica, que atribui a vida boa ao capital, a capacidade de acumular bens, ser bem sucedido, alcançar metas. Isso é tão problemático porque é a primeira vez, na história da humanidade, em que acreditamos que a vida boa é aquela que depende única e exclusivamente das nossas escolhas, da nossa capacidade de ter sucesso. O resultado disso ainda não é totalmente mensurável, mas nos percebemos esvaziados de qualquer sentido, perdidos, solitários, insatisfeitos e, sobretudo angustiados e ansiosos por acreditamos que nosso sucesso e felicidade só depende do nosso querer.
Como já devem estar acostumados, não ofereço respostas e tenho dificuldade de encerrar textos, assim sendo, resta que você se vire e pense sobre as possibilidades que estão dadas.
Caloroso cumprimento e até semana que vem!
Solange Kappes
Psicóloga CRP 12/15087
E-mail: psicologasolangekappes@gmail.com
Redes sociais:www.facebook.com/solange.kappes | Intagram: @solangekappes