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Coluna | Era Sol que me faltava | Mude, mas comece devagar!

Coluna era sol que me faltava - Foto: Solange Kappes/ Barriga Verde Notícias

Olá, meus queridos. Princípios e fins são sempre um desafio para mim, assim também lhes é? Usualmente falamos do clima, da temperatura, ou queixamos de alguma coisa, mas enfim, é fim de ano e o pessimismo não cai muito bem nesta época. Hoje, eu gostaria de lhes falar, uma vez mais, de Clarice Lispector, esta singular escritora, que por intermédio de suas obras, buscou alcançar e desnudar as profundezas da alma, lancetando o âmago e disposta a clarear até o que temos de sombrio. Há poucos dias, celebramos seu centenário, e então, para registrá-lo, escolhi fragmentos de um de seus escritos para que possamos partilhar.

O texto que escolhi está intitulado como Mudar! Particularmente, gosto de ouvi-lo na declamação do eterno Abujamra. Vocês encontram no youtube, procure, vale os 5 minutos que despreenderão, é provocantemente bonito. Clarice começa:
“Mude, mas comece devagar, porque a direção é mais importante que a velocidade”.
É, já dizia o gato risonho, para quem não sabe para onde vai, qualquer caminho serve. Colocar-se disposto às mudanças é o único caminho possível para a evolução, para o aprimoramento de si. Tudo que é rígido demais, não se transforma e nem cumpre sua finalidade com maestria. Corda de instrumento muito rígida não produz bons sons e rompe facilmente. Mudar é a regra, mas é bom que seja devagar e direcionado, minimamente sabendo para onde se pretende ir.

Sabem, no consultório eu repito com frequência que a vida é a oscilação, horas em que ascende e horas em que descende, este é o movimento natural. A linha reta, a rigidez, a certeza, o equilíbrio, denotam a morte. Eu digo e repito sempre, porque penso que precisamos nos reacostumar disto, especialmente em razão de vivermos tempos que pregam o hábito e o equilíbrio como condições para vidas estáveis e bem sucedidas. Quando assim acreditamos, beligeramos contra algo maior que nós, a frustração e a sensação de vazio parecem meio inevitáveis.

Como somos apaixonados por dicas, conselhos, orientações, que então, levemos em consideração às de Clarice:
“Sente-se em outra cadeira, no outro lado da mesa. Mais tarde, mude de mesa. Quando sair, procure andar pelo outro lado da rua. Depois, mude de caminho, ande por outras ruas, calmamente, observando com atenção os lugares por onde você passa […] Não faça do hábito um estilo de vida. Ame a novidade. Durma mais tarde. Durma mais cedo. Aprenda uma palavra nova por dia, numa outra língua. Corrija a postura. Coma um pouco menos, escolha comidas diferentes, novos temperos, novas cores, novas delícias”.

Algumas linhas são incontestavelmente lindas, não é mesmo? A gente tende a pensar, agir e sentir de forma muito polar, e não é preciso, não pensem que a vida precisa entrar em transformação como um trem desgovernado, talvez o segredo da mudança esteja também em saber como e quando aplicar o freio. Afinal, como Clarice já afirmou, mais importante que a velocidade é a direção. Além disso, algumas permanências e continuidades são tão fundamentais quanto o dinamismo e a maleabilidade. E, como na vida nem tudo são flores, esteja ciente de que as mudanças podem ser desagradáveis, dolorosas, difíceis.

Me despeço com as palavras de Clarice:
“Você certamente conhecerá coisas melhores e coisas piores do que as já conhecidas, mas não é isso o que importa. O mais importante é a mudança, o movimento, o dinamismo, a energia. Só o que está morto não muda! Repito por pura alegria de viver: a salvação é pelo risco, sem o qual a vida não vale a pena!!!!”