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Coluna | Era Sol que me faltava | E quando tudo ofende?

Coluna era sol que me faltava - Foto: Solange Kappes/ Barriga Verde Notícias

E quando tudo ofende?

No livro da vez, O homem sem qualidades, de Robert Musil, encontrei provocação no trecho para parafraseio para vocês a seguir. Antes disso, faço gosto em pontuar que os assuntos em voga, aqueles que viram moda facilmente, em nada despertam meu interesse, assim já justifico minha fidelidade à escrita sobre conteúdos que brotam do nosso âmago, ou então, aqueles que se mostram como fenômenos psicossociais. Enfim, segue o trecho:

“Podemos encarar as coisas que nos acontecem, ou que fazemos, de um modo mais geral ou pessoal. Podemos sentir um golpe, além de como dor, como ofensa, o que o aumenta intoleravelmente […] O alheamento é apenas uma diferença de postura, de certa forma uma decisão da vontade, ou o lugar entre generalidade e pessoalidade, em que se resolveu viver” (p. 159).

E o que isto tem a ver com o título que sugere que vivemos em uma era de ofendidos? Vejam bem, em tempos onde a informação circula descontrolada e desacauteladamente, é quase inevitável emitirmos opinião sobre tudo e, sermos também atingidos por opiniões alheias. Este é o ponto do trecho, talvez o golpe seja irrefreável, mas o fato de pessoalizarmos tudo e nos ofendermos potencializa o dano.

Ademais, é um grande saco regular tudo que se fala ou escreve, inclusive o uso de metáforas parece fazer parte do que é considerado politicamente incorreto. Isto é parte fundante dos problemas comunicacionais que atravessamos, alcançando o sumo ridículo de termos de agredir a linguagem para não ofender ninguém.

Fomos criados e estamos criando para que todos sintam-se maravilhosos, virtuosos, lindos, inteligentes e incluídos. Existe uma incapacidade crescente de lidar e valorizar o diferente e de reconhecer verdadeiros potenciais. Do primeiro ao último colocado na gincana escolar há premiação, ninguém pode ficar triste ou sentir-se derrotado. Céus, não lhes fica evidente o enorme problema que se cria em detrimento disso? A vida realmente oferece recompensa para tudo? realmente temos capacidade para qualquer coisa? nunca seremos derrotados? nunca haverão pessoas melhores que nós?

Já considerou cometer um erro, no ambiente de trabalho, por exemplo, e precisar receber uma correção verbal? Nossa, em primeiro lugar já está extremamente desafiador para quem precisa fazê-lo conosco encontrar palavras que possam ser utilizadas. E em segundo lugar, pessoalizamos e vitimizamos tanto que não conseguimos mais dicernir e compreender que temos condutas inadequadas, o que não quer dizer que somos sujeitos inadequados.

Quase cansei, mas aguenta que tem mais. Percebam, ao mesmo tempo que os discursos, especialmente os intrafamiliares e os do ambiente escolar, reforçam os narcisos oferecendo “lugar especial” aos sujeitos, o universo online joga à quase todos no anonimato, é óbvio que isto corrobora para a sensação de esvaziamento do sentido da vida, de irrelevância, incapacidade e invisibilidade. E aí, o que fazemos? tomamos alguns para “ídolos” porque precisamos de identificação, e chegamos ao cúmulo de nos ofendermos até se alguma crítica for direcionada à eles.

Se tudo te ofende, recue! Você não é tão especial assim.

Caloroso cumprimento e até semana que vem!

Solange Kappes
Psicóloga CRP 12/15087
E-mail: psicologasolangekappes@gmail.com
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