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Avareza… Um gozo interrompido!

Coluna | Era Sol que me faltava

Nesta semana chegamos ao quinto círculo do purgatório de Dante, povoado pelos Avarentos. O que caracteriza os três pecados daqui em diante é o amor excessivo. No caso dos conhecidos “Pão duro”, esse afeto excessivo é direcionado à materialidade, aos bens, em resumo, ao dinheiro. O castigo aplicado aos avarentos é o de permanecerem constantemente estendidos de bruços ao chão, com o rosto coberto de lágrimas e virado para a terra, decretando que suas almas estão presas ao pó.

De forma muito prática, a avareza se caracteriza por aquela necessidade infindável de juntar e acumular, atrelada à proibição da fruição dos bens, ou seja, visita e estimula o desejo mas interdita o gozo. Quando nos deparamos com um avarento a característica que mais salta aos olhos é sua mesquinhez e sua ganância, traduzida comumente para o apego excessivo aos bens. Podemos afirmar então que o oposto da avareza é o exercício da generosidade.

Observando as nuances dos pecados e a forma como são percebidos por nós na contemporaneidade, ao que parece, a avareza é um dos menos incômodos aos nossos olhos, é o que mais facilmente se transveste de virtude, anunciando-se como cautela, precaução e/ou prudência. Me intriga algo neste pensamento, afinal, nossa sociedade atual, hedonista e fortemente regida pelo consumo, instiga constantemente ao prazer de gastar e, ao mesmo tempo, parecemos cada vez mais circundados de gananciosos acumuladores. 

Na forma da moral cristã a avareza tornou-se pecado capital pois, aquele que apega-se e desenvolve amor pelas coisas, de forma inapercebida, desconfia da divina providência, desconfia do amor de Deus e do fato de que a ele é destinado o tudo prover. Além disso, é outro forte valor cristão a caridade, que o avarento também é incapaz de praticar. De acordo com São Tomás de Aquino, a capitalidade do pecado perpassa necessariamente o potencial de produzir outros vícios, e da avareza brotam traições, mentiras, fraudes, perjúrios, inquietudes, violências, entre outros.

Esse pecado é facilmente aplicado à política e a vida de pessoas públicas, na compreensão de Maquiavel, por exemplo, uma das poucas ações que nos fazem crucificar nosso governante e julgar suas ações como imperdoáveis é o fato de confiscar nossos bens ou aplicar mal os recursos do Estado. Inevitavelmente recaio no conceito de Ressentimento de Nietzsche que, em miúdos, diz respeito ao ódio, dor e sofrimento que desenvolvemos quando não somos capazes de suportar que outros sejam beneficiados de algo que os coloca próximo à minha condição. Talvez faça compreender porque as políticas públicas são sentidas com tanto desprezo por algumas classes sociais. 

Finalmente, é sempre complexo o limiar entre vício e virtude, tratar de equilíbrio é perigoso e burro, afinal, nem pra isso há parâmetros claros. Mas sendo a avareza um prazer não natural e não necessário, passa a afirmarmar-se como um tormento para a alma quando escraviza o homem, tornando-o refém de si próprio, fazendo com que ele perca a capacidade de discernir sobre o que é supérfluo e o que é necessário e, nos casos mais extremos, fazendo-o sofrer ao ter que gastar com o que é necessário.

Obra: Adoração do Bezerro de Ouro de Nicolas Poussin (1594-1665), pintor francês do Barroco

Caloroso cumprimento e até semana que vem. 

Solange Kappes
Psicóloga CRP 12/15087
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